A Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 3267/19, que busca uma reformulação do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) e atualmente depende de aprovação do Senado e posterior sanção presidencial para entrar em vigor. As mudanças representariam uma flexibilização extrema do sistema no Brasil, onde todos os anos morrem cerca de 40 mil pessoas em acidentes de trânsito. Em meio às discussões sobre segurança, o que muda para o condutor caso o projeto de lei seja aprovado?
Há uma série de mudanças em detalhes específicos do CTB, mas três são de grande impacto aos condutores brasileiros, as quais aqui nos delimitamos: quais órgãos podem ou devem instaurar processos de suspensão de CNH; alteração no processo de renovação da mesma; e, o sistema de pontos na carteira.
Atualmente, o órgão competente para instaurar os processos de suspensão de CNH, seja em decorrência de infração que preveja essa penalidade, seja pelo acúmulo de 20 pontos, é o Detran do Estado onde o condutor está registrado. Com o Projeto de Lei, essa competência se transfere para o órgão autuador, ou seja: quem lavrou a infração, como por exemplo a Polícia Rodoviária Federal ou o órgão de trânsito Municipal.
Essa alteração causa alguns questionamentos e preocupações, uma vez não é crível entender que todos os órgãos de trânsito estarão preparados para a administração de um processo administrativo que respeite o devido processo legal e efetivamente venha a penalizar os condutores que assim deveriam ser penalizados.
Isso poderá provocar dois principais efeitos, entre outros: uma inadequada administração do processo administrativo, de forma independente e distinta por cada órgão de trânsito, o que certamente confundirá o cidadão administrado, sendo muito provável que a garantia do contraditório e da ampla defesa não tenham o espaço devido em tais procedimentos; e, o que também não resguardaria a mínima segurança e/ou educação no trânsito, seria o fato de que os procedimentos de suspensão sejam desprezados pelos diversos órgãos de trânsito, vindo a imperar a impunidade que, infelizmente, acaba por potencializar as mortes vitimadas pelo trânsito brasileiro.
A título de exemplificação, a alteração proposta se daria da seguinte forma: Se um condutor paulista estiver conduzindo algum veículo no Rio Grande do Sul, onde vier a cometer alguma infração que preveja a suspensão da CNH (ex: Excesso de velocidade acima de 50% do limite da via), lavrada por algum município gaúcho, seria este município o órgão responsável na aplicação da penalidade de suspensão deste condutor paulista. Certamente que toda a logística logística no procedimento administrativo desta penalidade de suspensão é muito melhor efetuada pelo DETRAN de São Paulo do que pelo município gaúcho, em relação a esse condutor paulista.
Logicamente que esse é apenas um dos aspectos preocupantes dessa proposta, entre tantas outras variáveis de duvidosa aplicação na prática.
Outra mudança proposta é em relação à renovação da CNH: hoje a regra geral de validade é de 5 anos para todos os condutores. A proposta de alteração prevê que: para pessoas de até 50 anos, a validade da CNH passa a ser dez anos; para pessoas acima de 50 anos, a validade se manteria em cinco anos; e, para os condutores acima de 70 anos a renovação se daria a cada três anos.
Em relação ao sistema de pontos, a alteração é drástica e a depender das “lentes” utilizadas, preocupante. Hoje, um condutor que acumular 20 pontos, ou mais, no seu prontuário durante o período de um ano, deve responder a processo de suspensão do direito de dirigir. O projeto de lei traz uma proposta em escala:
- A suspensão de daria pelo acúmulo de 20 pontos (ou mais em um ano) se entre elas houverem duas infrações de natureza gravíssima;
- A suspensão de daria pelo acúmulo de 30 pontos (ou mais em um ano) se entre elas houver apenas uma infração de natureza gravíssima;
- A suspensão de daria pelo acúmulo de 40 pontos (ou mais em um ano) se entre as infrações não houver nenhuma infração de natureza gravíssima.
Isso pode parecer benéfico ao condutor, mas levanta sérios alertas em relação à segurança no trânsito. Em um sistema tão flexibilizado, em que é possível ter muitas infrações sem uma grande penalidade como a suspensão da CNH, é difícil acreditar que condutores serão mais responsáveis e que o número de acidentes diminua.
Em casos de condutores que exerçam atividade remunerada (EAR), a flexibilização é ainda maior: condutores com EAR inscrita na CNH não se obedeceriam a escala acima indicada e somente estariam passíveis de suspensão da CNH ao alcançar 40 pontos, ou mais, em 12 meses, independentemente da natureza das infrações. Neste ponto a proposta é ainda mais condescendente, pois a este condutor (EAR) seria possível realizar o curso preventivo de reciclagem, sem cumprir qualquer período de suspensão, sempre que chegarem alcançarem 30 pontos.
Em que a categoria dos profissionais sempre argumentou que os custos de renovação e reciclagem era um ônus para os trabalhadores, é difícil acreditar que uma flexibilização tão extrema seja benéfica à sociedade brasileira como um todo, principalmente ao se contemplar a quantidade de mortos e sequelados pelo trânsito no Brasil.
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